Um mês em casa
Chegámos às quatro semanas num piscar de olhos. Mentiria se dissesse que acreditava mesmo que iam ser só duas semanas mas a esperança é tramada e parece que permanece, mesmo que enterrada no fundo de nós. E agora eis-nos há um mês fechados em casa, sem ainda grandes perspectivas de ver este cerco aliviar.
Voltei ao trabalho esta semana. A partir de casa, é claro, mas sempre dá para criar aquela ilusão de que tudo está mais ou menos normal. Vejo toda a gente com as suas chamadas com equipas inteiras mas o meu trabalho continua a ser uma coisa mais solitária e, com excepção das chamadas com a minha chefe para fazermos o ponto de situação, sou só eu no nosso escritório, com vista sobre a nossa cerejeira em flor. Trabalhar é um pouco mais complicado do que o habitual, especialmente em termos de equipamento (não é fácil passar de dois grandes monitores para o limitado monitor do laptop mas parece que uma pessoa se habitua a tudo). Mas o que é mesmo mais difícil é ouvir os gritos dos miúdos, as birras e as brigas enquanto me tento concentrar. Voltei a usar os meus headphones.
Para bem da minha sanidade mental, mantenho a mesma rotina de sempre. Continuo a fazer exercício, a duchar-me e vestir-me todos os dias como se fosse para o trabalho, a ler as notícias antes de começar mesmo a trabalhar, a ter a minha água comigo. Dava tudo para poder trabalhar alguns dias a partir de casa quando esta situação toda voltar ao normal (se é que isso é possível): poder acordar minutos antes de me sentar ao computador, por exemplo, faz-me ganhar imenso tempo. E nas minhas pausas (que no escritório normalmente não faço) posso fazer camas, estender roupa ou tirar a louça da máquina. Todos os dias tenho feito uma caminhada em parte da minha hora de almoço: como qualquer coisa rápido e saio durante uns vinte, trinta minutos. Estico as pernas, inspiro fundo e cheiro esta Primavera que tem sido tão generosa em termos meteorológicos, mesmo que não a possamos aproveitar na sua plenitude.
Os miúdos continuam a ser compreensivos. De vez em quando, falam da escola e do que vão fazer e mostrar aos amigos quando regressarem mas têm aceitado tranquilamente esta ideia de não sair do perímetro da nossa casa. Mas, ao mesmo tempo, estão fartos. Discutem por tudo e por nada, gritam e nota-se bem que estão a precisar socializar com outras crianças que não os irmãos. O Augusto começa a escola em Setembro e começo a temer que já não lhe reste muito tempo de creche, a Amália e o Vicente vão continuar com os mesmos professores para o ano, o que me parece ser uma vantagem, dadas as circunstâncias. Só já penso em deixá-los correr numa praia qualquer. E em deitar-me à beira duma piscina, mas sem filhos…