Borboletas na Barriga

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Oito meses de silêncio e uma revolução, parte I

Passam quase oito meses (ao dia) desde que escrevi pela última vez neste blog. E, curiosamente, o meu último post versava sobre uma comemoração: passavam dez anos desde que tínhamos chegado ao Luxemburgo. Não deixa de ser incrível (para mim) que hoje, oito meses depois, eu esteja a escrever este post da nossa sala em Portalegre.

Para os mais distraídos, é preciso dizer que deixámos o Luxemburgo em Setembro. Deixámos de ser emigrantes, depois de dez anos a viver longe de Portugal e voltámos, para surpresa de muita gente, para Portalegre. De certa forma, foi também uma surpresa para nós mas não posso dizer que tenhamos tido dúvidas acerca do nosso destino: o acordo era tácito, estávamos em sintonia.

Quem me conhece, sabe que eu nunca sonhei com o Luxemburgo e tinha a esperança que a nossa passagem por lá fosse curta. Primeiro passou um ano, depois mais cinco e depressa chegámos aos dez anos. Uma década a viver num país tão estranho, sobre o qual é não sabia quase nada - apenas que era (é) considerado um paraíso fiscal e onde vivia uma enorme comunidade portuguesa. Não foi fácil gostar deste país à primeira: o meu Francês não era o melhor, o Alemão muito menos, nem falemos do Luxemburguês; os luxemburgueses não são propriamente os mais calorosos e acolhedores vizinhos que se pode ter; o clima é tão diferente do nosso clima mediterrâneo; tudo é sério e eficaz e irrepreensível e imensamente rígido. Mas não se vivia mal e nós estamos bem quando estamos os cinco e dois bebés nasceram lá e os empregos eram estáveis e sem termo - tudo razões para ficar.

Mas depois aconteceu uma pandemia. Eu vi-me “fechada” num país estrangeiro, sem saber quando poderia atravessar meia Europa para ver a nossa família, somando anos longe sem poder comemorar nascimentos e casamentos, sem poder chorar as pessoas que nos deixaram, longe de tudo. A ideia de regressar tornava-se mais e mais premente, uma verdadeira necessidade que eu tinha dificuldade em articular. Chorei em muitos fins de férias, olhos postos no retrovisor, vendo a minha cidade e, depois, o meu país, desaparecerem em madrugadas ora luminosas, ora escuras como o breu. Os nossos filhos também choravam quando se aproximava a altura de dizer adeus e eu convencia-me que uma dia havia de ser até já.

A pandemia não trouxe apenas o isolamento e o medo: trouxe também essa coisa incrível chamada teletrabalho. Para mim, que sempre pude aproveitar essa oportunidade, foi uma mudança radical e depois de Março de 2020 nunca mais voltei a pôr os pés no escritório de maneira recorrente. Ia o menor número de vezes possível, apenas quando era absolutamente indispensável e foi assim que, pela altura do verão de 2021, eu ousei pensar naquilo que, no fundo, nos deixou voltar: se eu posso teletrabalhar a partir do Luxemburgo, então porque não posso fazê-lo desde Portugal? No dia nove de Junho de 2021, eu vocalizei esse desejo, eu falei das possibilidades e o M., que antes nunca tinha considerado sair do Luxemburgo, concordou comigo - foi o dia zero para nós.