Borboletas na Barriga

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Na espuma dos dias

Cá estamos, exactamente um ano depois. Não há razões para comemorar mas toda a gente se lembra do que fez nesse dia. Eu cá respirei de alívio, é do que me lembro melhor. Disso e de ir ao supermercado antes de ir trabalhar, bem cedo, e ver o supermercado cheio de pessoas que se abasteciam para o desconhecido que tinha sido anunciado na véspera, caras de quem se sente um pouco perdido, desorientado e sem saber o que esperar. Um ano depois, muita coisa mudou mas acho que continuo sem saber o que esperar.

Acompanhei o anúncio do António Costa sobre as medidas de desconfinamento que aí vêm. Fiquei feliz, especialmente por me lembrar da maneira inclemente e assustadora com que o país foi sacudido no mês de Janeiro, depois daquele jeitinho do Natal. Fiquei contente por saber que os filhos dos amigos e da família vão poder regressar à escola, que parte das actividades económicas vão voltar a funcionar, aos poucos e senti quando as pessoas festejaram a possibilidade de voltar a beber um bom cafè! Fico a torcer os dedos para que as pessoas não baixem as guardas e continuem a respeitar as recomendações que, apesar de já todos conhecermos de cor, ainda há quem ache que não precisa respeitar.

Por aqui, continuamos mais ou menos na mesma. Esta semana, pela quinta vez desde Setembro, tive um dos miúdos em casa depois de terem encontrado dois casos na turma (desta vez, o professor e uma aluna). A mudança para ensino à distância foi preparada na véspera e correu bem, fruto da experiência de um ano inteiro. Com casos destes a sucederem-se, e numa semana em que 294 classes estiveram em isolamento ou em quarentena, apenas me pergunto quando vai chegar a nossa vez. Não temos vida social há um ano e os miúdos só socializam na escola e nos tempos livres. Ao menos isso não lhes tem sido negado. Cumprimos à regra todas as recomendações e só arriscamos em actividades ao ar livre, onde não encontramos outras pessoas ou onde, pelo menos, não há multidões. Deixámos de viajar, os restaurantes e bares continuam fechados há meses e ainda sem plano para a sua reabertura.Há esperança que as esplanadas possam abrir no início do próximo mês mas sem garantias.

A pandemia vai progredindo devagarinho aqui mas ainda mais devagarinho vai o processo de vacinação. É difícil não desanimar: num país com 600,000 habitantes, isto podia ser feito num instante. Até agora, só umas 40,000 pessoas foram vacinadas e falamos apenas do pessoal da saúde e das pessoas que vivem em lares. Quando ouço que os Estados Unidos vacinaram três milhões de pessoas num só dia, só me apetece sair daqui a correr e nunca mais voltar. Aparentemente, o processo de vacinação não corre muito bem e também não há vacinas suficientes, por isso é aguentar e não chorar.

Continuo a trabalhar em casa, um ano depois. Ainda fui ao escritório umas semanas durante o Verão mas de resto foi sempre a partir da nossa sala. Trabalho bem mas talvez precisasse mesmo de trazer os meus monitores para casa. Durante a semana, evito as correrias de levá-los/buscá-los à escola e posso fazer mais coisas em casa durante o dia. Se me derem a escolher, dificilmente volto ao escritório a 100%.

Com este tempo (ontem fomos fustigados pela tempestade Luís e tivemos ventos fortes, vergastadas de chuva e granizo, depois uns segundos de Sol só para gozar com a nossa cara…), passamos o fim de semana em casa. E, enquanto os miúdos jogam consola, eu aproveito para ler umas páginas ou para tricotar. Já há umas semanas que andava sem vontade de pegar nas agulhas mas hoje voltei, inspirada.

Continuo, como toda a gente, a sonhar com o fim deste pesadelo, que dificilmente será este ano, pelo andar da carruagem. Ainda bem que gosto da minha casa, ou então estava decididamente a dar em maluca…